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quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Dois de Novembro



Não vou acender vela hoje

Tenho amanhã para lembrar os meus mortos
Os seus sonhos, suas dores, seus caminhos tortos.
Hoje é dia dos finados,
Determinaram um dia para que eu possa lembrá-los
Acender suas velas,
Derramar minhas lágrimas por causa de hoje
Coroar de flores seus túmulos
Entristecendo ainda mais a paisagem
Imaginar seus espíritos a desfrutar de coloridas viagens.

Não, eu não vou ao cemitério hoje
Seguir a procissão de hipócritas
Obedecendo a uma data como que robôs sentimentais
Pranteando seus entes queridos só lembrados na data
Sugerida por sei lá quem
Programados para se comover no dia 2 de novembro.
Os mortos estão mortos, pálidos e inertes
Do contrário arrancariam suas lápides sufocantes
Achariam graça de toda essa liturgia
Mas estão presos e não saem, sem tristezas sem alegrias...

Pensei comigo “como é cômico o nosso preconceito. Trágico!
Logo nós que somos miscigenação!
Refutando rituais indígenas, caçoando de seus costumes,
Mas seguindo semelhantes tradições.
Afinal, o que nos torna melhores?
Nossas velas? Nossos santos? Nossas flores?
Nossos mortos estão tão enterrados quanto os deles!”
Somos compostos das mesmas esperanças.

Observei estático de longe aquele fluxo incrível de pessoas
Vi barracas de cachorro-quente no cemitério,
Vi ônibus conduzindo os transtornados,
Vi o casal que flagrei certa noite trepando num daqueles túmulos,
Vi o homem que capina de raro em raro o campo-santo
Sempre na época de maior visita, inclusive as mais ilustres.
As cruzes são testemunhas
Das rezas indiferentes, das flores artificiais
Das chamas do fogo das velas sombrias,
Das lágrimas de crocodilo...

Não, eu não quero que me acendam velas.
Quero antes repousar experimentado o vazio absurdo
Tão cheio de mistérios que a indesejada há de me proporcionar,
Longe das multidões que choram para ficar em paz
Com suas próprias consciências, para não sofrer com a tortura moral.
Quero lembrar espontaneamente de meus entes queridos
E já que não sou Deus com o poder de ressuscitá-los,
Quero manter a esperança
De, num dia, no mais improvável, reencontrá-los,
Num desses dias em que acordo acreditando em vida eterna.

Não, hoje eu não vou ao cemitério.
Os mortos não precisam dos nossos desejos, de impérios.
Os mortos já não precisam de mim.
E depois de tudo consumado,
Eu não quero ser visto como um pobre coitado,
Não. Eu não quero ser lembrado no dia dos finados.
Os mortos não têm dias, já foram todos cremados.  

Por: Junivaldo Sá de Lima



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