O que será do João?
Ele não escutava, mas muitos no bairro onde ele morava sabiam de sua situação. Mãe doente; desempregado; a mulher fugiu com outro, também como agüentar depois de tanta luz cortada, água atrasada, vergonhas de cobradores e outras coisas, não é pra qualquer uma. Mas se ela “amasse ele” de verdade ficaria com o rapaz.
João ajudava todo mundo na rua, quando alguém precisava de gás era só chamar por ele que tudo estava resolvido, ele buscava. É... O João era boa praça.
Mas porque o cara não conseguia ficar em emprego nenhum? Ninguém sabe.
Um dia eu estava na frente de casa, colocando o lixo pra fora, era umas seis horas da manhã, quando a filha de dona Joana ia atravessar a rua pra ir a escola, tardinha! Veio uma moto em alta velocidade... Não sei de onde aquele rapaz saiu! Ele pulou agarrou a menina e conseguiu salvar a pobre. Pouca gente ficou sabendo, nesse bairro todo mundo trabalha e quem não segue o ritmo é vagabundo. Mas não o João, ele é diferente.
A coisa na casa de dona Rute foi ficando difícil ela estava com um mal de difícil recuperação precisava de uma ressonância magnética, mais de mil reais, o pobre do João tinha vergonha de pedir. Além do mais muita gente acreditava que ele era vagabundo. Eu não sabia o que fazer.
A velha, mãe dele ganhava 800 reais, mais de 100 ia em remédios, o resto ela comia com o filho único dela o João, luz e água era sempre paga. Quando o João foi morar com a Darlene, a contra gosto da mãe dele que dizia:
- “Procura moça virge João!”
Darlene já tinha um filho, o Salomão e teve outro com ele, o Marcio, que a gente chamava Mazinho. O pessoal dizia que nem esse era filho dele, pois andaram vendo a mulher dele dando uns arrochos num tal de Gibão, um homem bruto que mora do outro lado da cidade, não sei se é verdade. Até que o menino parece com ele!
Cada dia que passava eu via o João mais desesperado, a mão dele estava piorando cada vez mais, se não fizesse o exame, batia as botas em menos de dois meses.
Meu filho menor, o Augusto chegou em casa em disparada na sexta depois do colégio, eu perguntei:
- o que foi menino?
- Vi uns caras falando com o João!
- “Qué que tem isso moleque?”
- Não mãe, eles falaram que se o João levasse um bagulho pra eles lá pra Sacomã ele receberia 2 mil reais. O cara ficou balançado. Saí correndo pra ninguém me ver.
- “Meu Deus, é assim que a gente vê gente inocente se ferrando na televisão.”
Depois dessa conversa com meu filho meu coração ficou apertado. Apertadinho mesmo!
O que será que ele vai fazer?
Fiquei sabendo depois que a coisa toda será pra semana que vem. Mas o que fazer ele não se abre com ninguém! Depois que a mulher foi embora, aí piorou tudo!
Uma noite a mãe dele começou a tossir muito forte, depois vi o rapaz sair apressado. O que será que ele vai fazer?
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Quando a mãe do João piorou, parecia que ia bater as botas mesmo, vi o rapaz desesperado ir atrás dos malandros pra fazer a tal transação:
Mais tarde, a muito custo ele contou “tudinho” pra mim.
Ele foi a caminho dos traficantes, tudo estava preparado. Era só levar o pacote e pegar os dois mil, fácil assim!
Mas alguma coisa aconteceu com o rapaz. Depois ele me disse que foi um mau pressentimento. De ultima hora abandonou a idéia e resolveu tentar outro caminho.
João disse que um rapaz, também desempregado, o Manfred de Oliveira foi enviado para a missão em seu lugar, assim como o João Manfred era casado tinha dois filhos e estava em situação quase vexatória. Seu aluguel já estava vencido há três meses e ele e sua família estavam a beira de um despejo.
João estava na boca de fumo na hora em que o infeliz chegou:
- Aí sangue bom, o mano aí deu pra trás. O barato tava na mão dele e ele não quis. A fita agora tá na tua mão, é só fazer o serviço e se “adiantá!”
- Vai Fumaça, dá logo o bagulho que eu levo!
- Calma, gente boa, muita calma nessa hora! Tu “toma o busão” 44 e desce no Sacomã, sobe o morro e vai ter um cara te esperando, já passei a fita pro mano. Chegando lá “dois irmão vão te parar”, você fala que foi o Fumaça que mandou. Os cara vão pedir a senha, tu fala que é Charles Bronson, certo!
- E o meu pacote, quando eu pego?
- “Tu volta pra cá, eu vou batê” um fio pro Assombrado, confirmando a grana tá na mão. Aqui o papo é “responsa!”
João me falou que saiu de lá disparado e foi pensar num meio de resolver o problema de sua mãe.
Houve um estalo em sua mente, lembrou-se do Capitão Garças que gostou muito dele quando ele era recruta, era uma coisa gratuita, daquelas que não tem explicação. O tal capitão deu um telefone pra ele dizendo que o que precisasse poderia contar com ele.
João ligou pro capitão do Exército, disse se ele ainda tinha lembrança dele. Ele afirmou que sim. Foi logo no ponto:
- E aí rapaz tá precisando de alguma coisa?
João me disse que aqueles dois ou três segundos foram os mais longos de toda sua vida. A vida de sua mãe estava em jogo, além do mais a maioria das pessoas não está disposta a ajudar ninguém.
- Capitão, eu to com minha mãe muito doente... Se ela não fizer um exame pra saber direito do que se trata, periga morrer!
- Você quer o exame ou o dinheiro?
- O que o Senhor pude fazer.
A conversa continuou e tudo deu certo. O capitão nem emprestou. Deu o valor necessário.
Isso aconteceu há cinco anos e hoje o João tem um bom emprego, a mãe dele melhorou e depois bateu as botas, a mulher dele andou ensaiando voltar,mas o João partiu pra outra, quando tudo tá difícil até quem mais achamos que não nos deixará acaba abandonando o barco... É a vida.
Ah, ia me esquecendo o Manfred foi pego com a droga no ônibus, tá preso. Enquanto ele ia com 500g no ônibus do outro lado da cidade estava passando uma tonelada de pó. O trouxa caiu direitinho.
-Ei filho! Aquele ali é o João?
- É sim mãe!
- De carro novo hein!!!!
Haroldo Ribeiro
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