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segunda-feira, 30 de julho de 2012

Segredos e prejuízos



         Aconteceu no verão de 1998,
eu entrava no ônibus e notei um movimento suspeito, uma senhora estava assustada e parecia suar frio, ao seu lado um elemento forte, de semblante ameaçador colocava algo que parecia uma arma na pobre mulher, a impressão que eu tive é que ele sabia de algum valor que ela devia ter em casa e iria acompanhá-la até sua residência.
        Procurei não olhar muito para o lado em que ela estava sentada, desviava o olhar a cada vez que o malandro o direcionava para mim, os outros que estavam no coletivo não percebiam o que acontecia, a mulher começou a balançar os olhos com mais velocidade e olhava para mim como quem buscava ajuda, percebi que a coisa realmente era séria e algo muito ruim poderia acontecer.
        O ônibus estava quase lotado, mas as pessoas iam descendo e logo eu não poderia monitorar a infeliz criatura, num determinado ponto um policial militar subiu e ficou em pé ao meu lado, percebi que o malandro ficou apavorado, a mulher ensaiou um alívio, mas três pontos depois o homem da lei desceu.
        O bandido ficou de pé e a mulher também, ele deu sinal de que iria descer no próximo ponto, como iam descer mais dois passageiros além deles eu também fiquei atrás da mulher e desci. Eles seguiram por um lado e eu fingi que estava indo para outra direção, a rua tinha um asfalto pouco conservado e ainda havia sinais da chuva do dia anterior parei ao lado de um poste de luz e procurei o seu anonimato para me esconder. Ainda dava para ver a mulher e consegui perceber a hora em que o elemento deu uma cutucada mais forte na vítima.
        Comecei a seguir os dois e eles dobraram a direita, cheguei ao mesmo ponto alguns segundos depois, da esquina pude observar que a mulher entrava num edifício meio antigo, possivelmente sua residência, ela abriu o portão e seguiu com o homem para dentro de sua casa, quando os dois já estavam por pelo menos um minuto dentro da casa vi um mulher de meia idade e gorda saindo de lá, perguntei-a por aquela mulher refém dando suas feições, ela disse que a citada era moradora nova, Dona Osvaldina, pensava ter ouvido este nome, ela era casada com um homem que ninguém sabia o nome e que vinha em casa de quinze em quinze dias.
        Comecei a pensar no que aquela mulher me disse e não sei bem o porquê não liguei para a polícia naquele momento, tinha um orelhão bem perto, mas algo me dizia que existia algo muito maior em torno daquilo tudo, esperei a chegada do marido, pois a mulher dissera que a sexta-feira era o dia em que ele costumava chegar. Fiquei do outro lado da rua numa lanchonete, naquela época era solteiro e naquele dia saí mais cedo da fábrica em que trabalhava, assistia aos filmes policiais e tinha este tipo de aspiração em minha vida, ser um investigador de polícia.
        Em poucos minutos surgiu a imagem do homem, o marido, ele parecia arisco, olhava de um lado a outro com rapidez, ele deu uma última olhada para o lado de fora dos portões do prédio antigo e entrou; a escada ficava perto da garagem não tinha nenhum tipo de sinal de boas vindas era um conjunto construído pelo governo, a pintura já estava gasta e rachaduras não perigosas saltavam como veias de um corpo esquelético.
        Não consegui ficar onde estava e fui até a entrada do prédio, abri o portão e segui para a maior das surpresas de toda a minha vida.
        Eu costumo chamar apartamentos de casa, mas naquele lugar o que havia na verdade era uma construção, sem atrativos onde algo muito suspeito estava acontecendo, o pior de tudo é que o marido da mulher, a que entrou com o elemento suspeito, parecia extremamente preocupado, meu instinto de aspirante a investigador fez-me seguir até a entrada do apartamento, comecei a ouvir uma discussão que começava ficar acalorada, pensei em voltar e ligar para a polícia, mas alguém dentro da casa começou a chorar, se não tivesse acompanhado o cidadão do ônibus até aquele local diria que era ele quem chorava.
        Não dava mais para esperar decidi ligar para a polícia, desci do lugar em que estava atravessei a rua e peguei um cartão para ligar, mas algo incomum aconteceu, parecia uma transmissão de pensamento, antes que eu ligasse um carro da polícia civil chegou, eles entraram no edifício e gritos podiam ser ouvidos, de lá saíram não uma pessoa algemada, mas duas! Não entendi nada. É claro que eu não poderia dormir sem saber o porquê das algemas naquela pobre senhora e seu inocente marido.
        Para não perder muito tempo com ônibus resolvi tomar um taxi, o desvendamento desta intrigante história seria o meu pagamento. Entrei na Delegacia e encontrei Marcelo Romão Silva, notei que ele ainda tinha marcas de choro na face, a imagem que construí do homem marginal acabou. Tomei coragem e perguntei:
        - Boa tarde!
        -Boa tarde!
        Sem que eu o perguntasse ele me disse tudo o que eu precisava ouvir:
        - Notei que você olhava para mim dentro do ônibus, percebi que causei uma má impressão, talvez por ser negro, mas a grande verdade é que eu é que eu sou a vítima na história toda. Eu e minha família éramos pessoas felizes até que estes dois elementos chegaram em meu lar e ofereceram algo que sempre quisemos uma casa nova, eles moravam numa residência nova e nos garantiram que era deles, eu tinha umas economias e dava para pagar trinta por cento do valor cobrado fomos ao cartório conferimos tudo e os nomes batiam. Depois descobri que eles viviam de favor no lugar, mas já era tarde demais, o dinheiro já havia sido pago e nós ficamos na pior, minha mulher entrou em depressão e eu fiquei desempregado, minha patroa morreu de desgosto, um ano depois e eu e meu filho fomos morar de favor num fundo de quintal, após cinco anos de muita batalha consegui dar a volta por cima, aí decidi ir atrás dos que me enganaram e evitar que tudo ocorresse com outro incauto, procurei os dois por cinco meses, e naquele coletivo, em que você estava encontrei a mulher que me enganou.
        - E a polícia, como ficou sabendo?
        - Eu já havia avisado o delegado e eles fizeram um levantamento de tudo o que os dois aprontaram pelo Brasil, posso garantir que foi muita coisa ruim.
        Ainda falando com o meu mais novo amigo vi quando os policiais saiam com os dois algemados, o marido não olhava para ninguém, mas a mulher levantou os olhos e mirou-os em mim, percebi o quanto me enganei, o quanto fui um discriminador pensando que aquele homem era o lado mau da história.

História de Haroldo Ribeiro
imagem: policiaeviola.blogspot.com

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